A frase que dá título ao post foi dita por George Lucas quando da morte de Ray Harryhausen, em 2013.
Ray Harryhausen foi o mais conhecido pioneiro dos efeitos visuais no cinema, e trabalhou em filmes como Fúria de titãs (1981), As viagens de Gulliver (1960) e Jasão e o velo de ouro (1963).
Sua genialidade e sua criatividade superaram o baixo orçamento dos filmes, a tecnologia precária e incipiente de sua época e influenciaram diretores e produtores como Steven Spielberg (Tubarão), James Cameron (Avatar), Peter Jackson (O Senhor dos anéis), George Lucas (Guerra nas estrelas) e John Landis (diretor do clipe de Thriller, de Michael Jackson).
Harryhausen, como diria anos mais tarde, teve a felicidade de ser criado por pais que apreciavam estimular sua imaginação. Tanto que o levaram, com cinco anos de idade, para assistir a primeira versão cinematográfica de O Mundo Perdido, o filme onde ele pôde ver pela primeira vez o trabalho do homem que o inspiraria para sempre, Willys o’Brien.

A fita, adaptação do livro homônimo de Sir Arthur Conan Doyle, foi o primeiro longa a ter dinossauros animados com a técnica de stop-motion. O Stop-Motion é uma antiga técnica cinematográfica que basicamente é a filmagem quadro-a-quadro de bonecos ou objetos inanimados para a simulação de constante movimento. E até hoje esta primitiva técnica vem fascinando os cinéfilos. Mas é um recurso primitivo e praticamente extinto, não sendo mais usado (ou muito pouco usado) pelos modernos responsáveis em efeitos especiais.
O vídeo a seguir, de cerca de 3 minutos, explica rapidamente do que se trata..
Para Harryhausen, aquele filme, assim como os livros de fantasia e mitologia e as revistas de ficção-científica, foram as fontes de fascinação que sedimentaram seu interesse pelo gênero fantástico, cuja catarse ocorreu aos treze anos de idade, quando ele entrou no cinema para assistir a King Kong, em 1933, a obra-prima de seu futuro mestre O’Brien.
Absolutamente inovador, King Kong assombrou as plateias ao mostrar dúzias de sequências visuais espetaculares, e que jamais seriam obtidas por outros meios que não através da trucagem óptica, o termo que define o uso de efeitos visuais.
Harryhausen saiu do cinema embasbacado, porém decidido quanto ao que faria pelo resto da vida. Estudou desenho, teatro, pintura, escultura, etc, e tudo o mais que ele acreditava poder ser útil no novo ramo de efeitos especiais. Transformou a garagem da família em estúdio, e dedicou-se a aprender a arte de manipular objetos quadro-a-quadro, a essência da animação stop-motion. Com a ajuda dos pais, montou cenários para tentar a profissão, produzindo curta-metragens onde filmava contos de fadas clássicos, como Chapeuzinho Vermelho e Rapunzel. George Pal, outro profissional da fantasia cinematográfica, viu os trabalhos de Ray e o convidou para trabalhar com ele no George Pal’s Puppetoons. Uma espécie de show de marionetes animados em stop motion.
Mais tarde, Harryhausen teve o apadrinhamento do próprio mestre inspirador, Willys O`Brien, trabalhando como técnico de efeitos no filme de 1949 Mighty Joe Young. As inúmeras sequências de animação foram realizadas quase que totalmente pelo estreante (em longas metragens). Como pagamento, Ray levou parte do equipamento, o que auxiliou grandemente a carreira solo.
Seu filme O Monstro do Mar Revolto (It Came From Beneath The Sea, 1955), foi marcante e deveu-se ao fato do novo refinamento das sequências, que combinavam ação real e animação. Com tantos efeitos de primeira categoria, o filme só poderia se tornar num sucesso imediato. E foi o que aconteceu.
Nessa época, Harryhausen começou as experimentações que iriam permitir a feitura de truques mais convincentes. Primeiro, pintou telas de vidro, que mascaravam as mesas de animação, depois, naquilo que seria a grande inovação da técnica, ele refotografava o filme, para fazer com que os objetos animados tivessem uma interação melhor com as filmagens dos elementos reais.
Funcionava assim: uma primeira película de filme servia como base, e nela eram inseridos os elementos, animados ou não, que deveriam figurar em primeiro plano, contra o fundo natural. Depois outra camada de filme, com novos elementos fotografados, finalizando o filme a ser utilizado. Uma verdadeira colagem manual de películas, cujos resultados eram ilusões convincentes.
Era o truque que possibilitava que a criatura gigante saísse detrás de esquinas, ou se pudesse ver pessoas reais correndo atrás ou na frente do monstro.
Foi isso que ele aplicou no filme O Monstro do Mar Revolto… Na ocasião, um jovem produtor pretendia fazer um filme sobre um polvo gigante que destruía a ponte Golden Gate. Porém não tinha ideia de como realizá-lo, tecnicamente falando. Ele procurou Harryhausen para saber se o animador estaria interessado, e a resposta foi: “Eis aí algo em que eu gostaria de trabalhar”. A partir daí, começou uma parceria que duraria para o resto de suas vidas, adicionando uma coleção de filmes fantásticos ao imaginário pop do século XX.
De 1956 a 1958, Ray criou pequenas joias cinematográficas, sendo a mais popular – e a mais citada e parodiada delas – o pequeno clássico A Invasão dos Discos Voadores.
Finalmente em 1958, Harryhausen poderia mostrar sua genialidade em filmes à cores, e sua estreia foi com A Sétima Viagem de Simbad (The Seventh Voyage of Simbad), levando o nome de Harryhausen pela primeira vez nos cartazes de cinema. Neste filme, começa um ciclo de películas que relembravam os fatos curiosos e interessantes da mitologia clássica. O filme lotou as salas dos cinemas, e a geração intermediária de cineastas que o assistiu ainda bem jovem, gente como os citados acima (Spielberg, Lucas, Cameron…) anotou cada passo das criaturas fantasiosas que desfilaram pela tela, para basear os seus futuros trabalhos.
Após essa produção, cresceu em Harryhausen a vontade de explorar novos temas, abordar assuntos mais fantasiosos, como podemos notar nos filmes As Aventuras de Gulliver (The Three Worlds of Gulliver, 1960), e A Ilha Misteriosa (Mysterious Island, 1961), baseado na obra de Julio Verne.
No entanto, foram apenas um preparativo para uma das mais impressionantes adaptações no cinema de fantasia-aventura, Jasão e o Velo de Ouro (Jason and the Argonauts, 1963), no qual ele finalmente pode explorar sua antiga paixão pela mitologia clássica. Como não poderia deixar de ser, desfilam aí as mais impressionantes cenas de animação e aventura, como o antológico combate entre Jasão e um grupo de esqueletos, que impressionaram pela naturalidade dos movimentos.
O filme demorou três anos para ser finalizado, por causa unicamente das trabalhosas sequências de animação.
A cada novo filme, Harryhausen se aperfeiçoava mais em sua técnica dando-nos, inclusive, uma sequência arrasadora de filmes de aventura. E encerrou sua carreira em 1981, com sua obra-prima e o maior clássico da fantasia que o cinema já fez: Fúria de Titãs.
Diversas criaturas desfilam ao longo da história; talvez a mais impressionante seja a Medusa (monstro mitológico grego, metade mulher, metade animal com serpentes em lugar de cabelos e que transformava em pedra quem a encarasse). O terrível monstro marinho, Kraken, também é apavorante.
Ray se despediu fazendo de tudo um pouco dentro do filme, foi da suavidade do voo de Pégaso à aventura, ao terror impressionante da aparição da Medusa, e ao cuidado em apresentar os mitos dentro do contexto original, tanto quanto possível. Fúria de Titãs também representou o fim de uma maneira muito particular de fazer filmes. Um toque pessoal de fantasia, misturado com aventura e muito do espírito das matinês, o dos filmes para a família. Mas com um tempero fantasioso acessível a todos.
Ray Harryhausen foi um entusiasta dedicado a entreter o máximo possível de pessoas, com o cardápio popular da linguagem cinematográfica.
As mil e uma criaturas do mestre
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