A Segunda Guerra Mundial foi um período trágico no século XX. Não apenas por ter convulsionado a Ásia e a Europa e provocado milhões de vítimas, mas também por ter criado um período de grandes dificuldades econômicas para todo o planeta.
Os Estados Unidos só entraram diretamente na guerra em 1941, depois do ataque japonês em Pearl Harbor. Mas, antes disso, o país vinha apoiando os aliados, principalmente a Inglaterra, enviando armas, alimentos e munição por navio. Esse esforço de guerra, bastante ampliado mais tarde, canalizou os recursos do país para a produção de armamentos, navios e aviões, e treinamento dos soldados.
Isso, evidentemente, afetou as empresas americanas e a Walt Disney Productions foi uma delas. Além de ver o mercado europeu praticamente desaparecer, muitos dos animadores do estúdio foram convocados para as Forças Armadas. Um contrato exatamente com o governo acabou salvando a empresa. Por esse contrato, Disney deveria produzir centenas de horas de animação e milhares de desenhos e insígnias para todas as frentes do governo.
Afinal, os esforços de guerra eram válidos e aceitáveis. E todos sabiam que uma guerra de propaganda estava sendo travada em todos os fronts, portanto nenhuma oportunidade poderia ser dispensada para consolidar o moral do país.
A ilustração acima, para a edição de setembro de 1942 da revista Coronet, mostrava os personagens Disney na linha de frente, como milhares de outros nos campos de batalha da Europa e Ásia. O Donald, como marinheiro, simboliza que a caneta é agora igual à espada, enquanto outros personagens representam uma variedade de papéis em tempo de guerra: os porquinhos simbolizam o poder da indústria, Minnie é uma voluntária da Cruz Vermelha, Dunga compra bônus de guerra, Flor é membro do serviço de guerra química e Tambor é sinalizador do exército. O tigre voador e o esquadrão mosquito representam as mais de 1.200 insígnias criadas nos estúdios Disney.
Esse período fez com que Disney e seus criativos mergulhassem em temáticas até então distantes das produções costumeiras. Eles criaram projetos para o Departamento de Tesouro, incentivando a poupança. Campanhas de higiene e escovação de dentes, de doação de sangue, de racionalização dos alimentos (na época da guerra, além do petróleo, o país sofreu com racionamento de açúcar, café, carne, laticínios, etc etc) e muitas e muitas outras.
Depois da guerra, Walt embarcava de novo em suas grandes produções para o cinema e começava a desenhar seu projeto mais ambicioso, a construção da Disneylândia, sonhando ao mesmo tempo em explorar aquela novidade que surgia, a televisão.
Os filmes-pacote produzidos até então, como “Alô Amigos” ou “Você já foi à Bahia” (acima), que consistiam de 3 ou 4 média-metragens de produção mais rápida e mais barata, e filmados ao mesmo tempo que as encomendas do governo, não davam muito lucro. E dinheiro era o que o estúdio mais precisava.
Aproveitando as competências aprendidas na produção dos curta-metragens, eles foram oferecer seus serviços para as grandes empresas, criando então filmes educativos sob encomenda e inaugurando, por assim dizer, essa prática que até então não era disseminada. Seriam o que hoje chamamos de “comerciais de TV”, só que mais compridos e exibidos nos cinemas, ou em projeções fechadas para públicos específicos.
Essa vertente não durou muito. Primeiro, porque Walt estava mais interessado em expandir a produção para o cinema, tanto em longa-metragens de animação (“Alice no País das Maravilhas”) quanto documentários e “live-actions” (ele começava a planejar “Vinte Mil Léguas Submarinas”). Segundo, porque vários animadores tinham saído dos estúdios para trabalhar na concorrência, alguns até fundando seu próprio estúdio, a UPA.
Mas alguns desses filmes sobreviveram ao tempo, como “A História da Menstruação”.
“The History of Menstruation” foi encomendado em 1946 pela Companhia Cello-Kotex International (atual Kimberly-Clark) e exibido para cerca de 105 milhões de estudantes americanos em aulas de educação sobre a higiene feminina. Ele foi considerado o primeiro filme a usar a palavra “vagina”.
Imagine que, naquele tempo, as pré-adolescentes não recebiam muita informação sobre sexualidade, o que poderia causar espanto em muitas delas quando a primeira menstruação chegava. O assunto ainda era um tabu para as mães.
O curta, de dez minutos, foi feito sob consultoria de um ginecologista, algo que aumentava a credibilidade da produção, e foi ainda distribuído com um livro chamado Very Personally Yours, que tinha informações sobre o assunto e anúncios sobre absorventes e coisas do gênero.
O curioso é ver a visão bastante antiquada e recatada que se tinha sobre sexualidade, tanto que não há referências a sexo ou reprodução, apenas as questões comuns sobre o processo menstrual e higiene. Outro ponto curioso é notar que a narradora afirma que a menstruação não tem nada de misterioso e estranho… E o filme mostra mulheres em atividades “normais”, como cavalgando, tomando banho ou dançando durante o ciclo menstrual. Como não há referência a sexualidade, tudo é apresentado mais como um problema de higiene, tanto que a menstruação é branca, e não vermelha.
E, claro, como o projeto era patrocinado, nos anúncios do Kotex no livreto, as meninas eram desencorajadas a usar o absorvente interno, cujo mercado era dominado pelo Tampax, da concorrente Procter & Gamble.
Seja como for, o valor histórico e nostálgico de assistir a uma produção dessas da Disney é inquestionável.
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