Era 1954, e os Estados Unidos viviam sob o signo do medo. A guerra fria estava no auge. Por causa da paranoia anticomunista, Charles Chaplin não podia entrar no país e Albert Einstein era investigado pelo FBI. O clima de temor e suspeita era propício a qualquer iniciativa “moralizadora” dos costumes.



Naquele ano, o renomado psiquiatra Fredric Wertham publicou seu livro A Sedução dos Inocentes, que descrevia em detalhes os “efeitos nefastos” dos gibis sobre as crianças. A saber: fomentavam a delinquência juvenil, a discórdia entre irmãos, o mau hábito da garotada de não comer legumes e verduras e, se isso não bastasse, de estimular o homossexualismo. O livro incentivou o Congresso a vasculhar a indústria das HQs e a colocar Batman e Super-Homem no banco de réus.
Credenciais não faltavam ao doutor para convencer a opinião pública da época. Era o psiquiatra-chefe do maior hospital psiquiátrico de Nova York, o Bellevue. Na década de 1920, recém-formado, correspondera-se com ninguém menos que Sigmund Freud, pai da psicanálise.
A reputação de Wertham era ilibada, mas algo aparentemente não ia bem com a psique do doutor. Assim como em muitas tramas de gibi, o genial estudioso foi ficando aos poucos obcecado por aquele objeto de repulsa e desejo. Suas pesquisas passaram a associar a leitura de quadrinhos com a violência. O psiquiatra lançou-se então numa violenta campanha, condenando os pobres gibis em dezenas de artigos e entrevistas.
Foi Wertham quem plantou a semente da história da homossexualidade de Batman e Robin. Tudo porque, numa história, Bruce Wayne e Dick Grayson trocavam as roupas civis pelos uniformes de herói, separados apenas por um biombo. Por causa dessas insinuações, a DC Comics teria criado a figura paternal do mordomo Alfred, a fim de frear a fama de gay do homem-morcego.
O fato é que, com a publicação de A Sedução dos Inocentes, revistinhas foram queimadas em público no estado de Nova York. Um comissário de polícia de Detroit, Harry S. Toy, declarou que os gibis estavam infestados de ensinamentos comunistas. Os distribuidores começaram a devolver os exemplares que recebiam para vender. E a confusão serviu de estopim para que o Congresso instituísse uma subcomissão de investigação dos quadrinhos, nos mesmos moldes daquela criada para investigar as atividades comunistas no país.
As editoras, temendo uma regulamentação do governo, criaram o Comics Code, que nada mais era do que um código de autocensura. Entre 1954 e o início da década de 1970, o código exerceu seu poder de forma implacável na indústria dos quadrinhos. Só em 1971 as editoras passaram a questioná-lo: a Marvel, numa história do Homem-Aranha, mostrou Harry Osborn, amigo de Peter Parker, numa viagem de LSD.
Wertham tentou escrever uma sequência de seu famoso livro, desta vez tratando dos efeitos da TV nas crianças, mas, para sua frustração, nenhum editora se interessou em publicá-lo.
O doutor sempre negou que suas críticas aos quadrinhos tivessem favorecido a censura e dizia que, em princípio, nunca teve nada contra eles, apenas contra as mensagens implícitas em seu conteúdo. Tanto que, no começo dos anos 1970, focou suas pesquisas nos aspectos benignos da cultura dos fanzines. Em seu último livro, publicado em 1974 e chamado The World of Fanzines, ele concluiu que “os fanzines são um exercício saudável e construtivo para motivar a criatividade”.
Essa obra, porém, não serviu para redimi-lo perante os fãs e os editores de quadrinhos, e ele morreu desacreditado por eles em 1981. O ex-menino prodígio da psiquiatria seria para sempre lembrado como o doutor que odiava os quadrinhos.
(Fontes: Superinteressante, internet, Wikipedia)
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