A fama de Alcatraz se firmou nos anos em que esse rochedo em frente à baía de San Francisco, no norte da Califórnia, abrigou uma prisão de segurança máxima e serviu de lar forçado a alguns dos gangsteres mais temidos dos Estados Unidos.
Entre 1934 e 1963, “A Rocha”, a alcunha que Alcatraz ganhou, foi a prisão-modelo em que eram detidos criminosos considerados perigosos demais para as prisões do continente. Alcatraz viveu a sua fuga mais célebre 53 anos atrás, em parte porque nunca mais se soube o paradeiro dos três detentos que escaparam. E também porque, depois disso, o governo americano ordenou o fechamento da penitenciária. Mas a lenda construída em torno do local seguiu se alimentando de relatos orais e de filmes de Hollywood.
Há alguns pontos-chave para entender as razões pelas quais a prisão se tornou um centro turístico que atrai milhares de visitantes todos os anos.
Uma prisão-modelo
Localizada em uma ilhota árida e rochosa no Pacífico, a primeira fortificação de Alcatraz for construída por volta de 1850 e utilizada como uma prisão militar. As autoridades avaliaram que o presídio fornecia segurança suficiente para frustrar qualquer tentativa de fuga. O argumento deles é de que seria impossível sobreviver no mar por causa das fortes correntes ou das baixas temperaturas das águas.
Em 1912, ali foi erguido o então maior edifício de concreto armado em todo o mundo. Mas foi o ano de 1933 que selou a fama de Alcatraz como uma prisão diferente. Ela se converteu na “prisão das prisões”, como a chamou a agência americana de prisões. O que significava isso, na prática? Que ela passaria a receber a população carcerária considerada muito indisciplinada para outros centros de detenção nos Estados Unidos.
Detentos famosos
De acordo com agência americana de prisões, a população carcerária de Alcatraz se manteve sempre abaixo da capacidade máxima do recinto. Em média, ela abrigou entre 260 e 275 prisioneiros, representando apenas 1% do total de presos em cárceres federais. Mas foram os personagens atrás das grades que ajudaram a consolidar a lenda de Alcatraz, sobretudo porque eram, em grande parte, figuras de destaque do crime organizado na época da Grande Depressão nos Estados Unidos.
O mais famoso foi, sem dúvida, Al Capone, líder da Máfia em Chicago. Ele foi enviado ao presídio porque, segundo as autoridades americanas, sua reclusão anterior, em Atlanta, não o havia impedido de continuar comandando sua organização. Capone ficou em Alcatraz por pouco mais de quatro anos, até ser diagnosticado com sífilis e transferido para outra prisão.
Também passou pelo local o gângster George “Machine Gun” Kelly Barnes que, apesar do apelido “Metralhadora” e de sua fama de durão, nunca matou ninguém. Ele passou 17 anos em Alcatraz.
Outro “hóspede” conhecido foi Alvin Karpowicz, apelidado de “Creepy Karpis” por causa de seu sorriso sinistro. Ele liderou a lista dos “mais procurados” pelo FBI nos anos 1930 e foi o último “inimigo público” a ser capturado vivo. Passou 25 anos na prisão.
Fugas frustradas
Nem mesmo os mais sofisticados mecanismos de segurança da época foram suficientes para impedir que alguns detentos tentassem fugir. A administração do presídio contabilizou 14 tentativas de fuga envolvendo 36 pessoas durante mais de 30 anos. Destes, 23 foram recapturados, seis morreram baleados durante a fuga e outros dois afogados. Cinco deles, no entanto, jamais foram reencontrados e passaram a fazer parte da lista de “desaparecidos”.
Dentre eles, estão os últimos a tentarem fugir: Frank Morris, Clarence Anglin e John Anglin, em 1962.
Nunca encontraram os fugitivos, nem seus corpos. Ninguém supunha que alguém pudesse sobreviver no mar gelado daquela região, além da distância da costa, mais de 5 km. Os três homens foram muito procurados – e continuam sendo. Hoje, Frank Morris, o mentor da operação, estaria com 85 anos se estivesse vivo. Os outros dois, os irmãos Anglin, estariam com 81 (Clarence) e 82 (John). Os mandados de prisão só serão revogados na data em que cada um completar 99 anos.
Como foi
Em 12 de junho de 1962, em Alcatraz, o tenente Bill Long fazia a contagem matinal dos detentos. E notou que um guarda não aparecera até então. Foi ao local em que o guarda deveria estar e viu que ele vinha correndo em sua direção. “Bill, tem um cara que não quer se levantar para a contagem.” “Vou fazer com que ele se levante”, respondeu o tenente.
Long foi até a cela indicada e viu um homem que parecia dormir. Através das barras, ele sacudiu o travesseiro e gritou: “Levante-se para a contagem”. Uma cabeça rolou ao chão. O tenente deu um pulo para trás e então percebeu que a cabeça era falsa, feita de sabão, papel-toalha e cabelos de verdade. Travesseiros cobertos na cama simulavam um corpo. Long correu ao telefone e deu o alarme.
Descobriram que Morris e os irmãos Anglin não estavam em suas celas, e em todas elas havia uma cabeça falsa e travesseiros cobertos, simulando o corpo da pessoa.
Os preparativos de Morris e dos Anglin duraram ao menos sete meses. Cada cela tinha um vão gradeado para ventilação. Eles roubaram um aspirador da sala de música e, com ele, fizeram uma furadeira e romperam as grades. Atrás do corredor de celas em que os três ficavam, havia um corredor de calefação raramente utilizado. Usando colheres e a furadeira, cavaram as paredes para alcançar esse corredor, depois de retirar as barras das aberturas da ventilação.
Fizeram barras falsas, de cola e papel pintado, que punham no lugar das verdadeiras quando não estavam cavando. Com o pequeno acordeão de John, Frank tocava e cantava nos horários em que isso era permitido, abafando o som da furadeira. Com audácia, abriram um espaço acima do teto das celas e o usaram como oficina. Lá, fora dos horários de patrulha dos guardas, fizeram um bote de borracha inflável feito com capas de chuva, costuradas e coladas com cimento. Havia ainda sacolas de plástico transformadas em flutuadores, remos e cabeças falsas.
Outro prisioneiro, Darwin Coon, que não quis participar da fuga, ajudou John a reunir o material necessário para executá-la. Coon trabalhava na cozinha e “acidentalmente” quebrava coisas que um amigo dele, John, da manutenção, vinha consertar. E, “distraidamente”, esquecia ferramentas.
Foi provavelmente Coon que passou a eles um exemplar da revista “Mecânica Popular”, mais tarde achado pelo FBI, que, “por coincidência”, ensinava a fazer um bote de borracha. O bote foi achado depois da fuga numa ilha próxima, e também um corpo no mar, que a princípio disseram ser de Morris. Mas isso foi desmentido.
No filme que Don Siegel fez em 1979 contando essa história, com Clint Eastwood no papel principal, eles têm sucesso. Possivelmente, esse final é o verdadeiro.
A Alcatraz de Hollywood
Além de A Fuga de Alcatraz com Eastwood, o filme A Rocha, de 1996, com Nicholas Cage e Sean Connery como astros principais (e Ed Harris como o vilão), mais uma vez destacou a prisão cuja fama e imagem foram tradicionalmente alimentadas por Hollywood ao longo do século XX. Historiadores e documentaristas, no entanto, dizem que o retrato hollywoodiano da ilha nem sempre foi fiel à realidade.
“Alcatraz não foi a ‘prisão maldita’ dos Estados Unidos, como muitos filmes e livros a caracterizaram. Na verdade, muitos presidiários consideravam que as condições de vida de lá, como as celas individuais, eram superiores às de outras prisões federais no país”, diz um porta-voz da agência americana de penitenciárias.
Outro filme muito famoso é O Homem de Alcatraz, de 1962, no qual Burt Lancaster interpreta um prisioneiro, Robert Stroud, “The Birdman of Alcatraz”, como ficou conhecido, por ter se tornado um especialista em pássaros.
Robert Stroud (Lancaster) foi preso por um assassinato cometido no Alasca, e se rebelava constantemente diante daquele rígido sistema penal. Para quebrar a monotonia, Stroud adotou um pássaro como animal de estimação. Quando o pássaro ficou doente, ele experimentou vários tratamentos até a sua cura. Com o passar dos anos, acabou trabalhando com vários pássaros, tornando-se um conhecedor de aves, e publicou mais tarde um livro sobre remédios para pássaros, além de escrever sobre a história do sistema penal americano.
A atuação de Lancaster conquistou a simpatia da opinião pública. Contudo, a história revela que o Stroud real era um assassino mercenário e que não mostrava remorso pelos seus crimes.
Atualmente, a ilha de Alcatraz é um dos pontos mais visitados de San Francisco, recebendo cerca de 1 milhão de turistas por ano, e serve também de ponto de partida para uma competição anual de triatlo, “Fuga de Alcatraz”, em que centenas de atletas provam que, com treinamento e equipamento apropriados, é possível sair da ilha e chegar são e salvo à terra firme.
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