A descoberta da Senhora do Cao (2)

(continuação do post anterior)

Os restos mumificados, que correspondem a uma jovem de cerca de 25 anos, estavam cobertos com 18 colares de ouro, prata, lapis-lazuli, quartzo e turquesa, 30 adornos de ouro e prata protegiam seu nariz, e diademas e coroas de cobre dourado resguardavam seus cabelos, símbolos que caracterizam os governantes. Mas no túmulo também foram encontradas clavas de combate, escudos e facas, os atributos de um guerreiro. E ela foi enterrada ao lado de outras cinco pessoas, certamente criados e seu guia espiritual, responsáveis pela guarda de sua ama no caminho até o além. Esse é outro fato que indica a importância da pessoa enterrada.

Em seus braços e pernas se apreciam sem dificuldade umas curiosas tatuagens rituais. São desenhos de serpentes e aranhas, animais que representavam para os mochicas a fertilidade do solo. E que, de acordo com Régulo Jordán, também dariam uma pista sobre seus dons de adivinhação.

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O arqueólogo Régulo Franco Jordán, a Dama de Cao e sua escolta.

Mas como este corpo poderia sobreviver 1700 anos neste estado tão perfeito se os mochicas não usavam técnicas de mumificação como as dos egípcios? A resposta está num pigmento e no peculiar clima da região. Os mochicas cobriam os cadáveres com uma pasta vermelha escura feita com cinábrio, uma mistura de mercúrio e enxofre que prevenia a proliferação de bactérias. Em seguida, o ambiente seco fazia o resto e os corpos permaneciam mumificados.

A Senhora de Cao levou na sua última viagem mais e maiores ornamentos fúnebres que o Senhor de Sipan, até então o mais importante enterro mochica conhecido, descoberto pelo arqueólogo Walter Alva em 1987. A Dama do Cao trazia, ao lado do fardo onde fora embrulhada em cerca de 30 metros de tecido,Momia Tatuada ainda tinha diversos vasos de cerâmica ao lado do fardo, dentre os quais dois que chamaram muita atenção: um deles representa o personagem chamado de engenheiro e o outro, mais misterioso e importante, descreve uma cena de curandeirismo. Nela, uma mulher envolta em um manto coloca suas mãos sobre o ventre de um bebê que está nos braços de sua mãe. Régulo Franco Jordán tem duas hipóteses, que a mulher encontrada na tumba seja ou a menina ou a mãe que está segurando o bebê.

A Senhora do Cao não foi enterrada sozinha. Em seu funeral foram realizados rituais mágicos não isentos de sacrifícios humanos. Junto ao fardo da governante forem encontrados também os restos de uma adolescente que pode ter sido estrangulada e entregue aos deuses como oferenda. Ao sul da tumba havia ainda os restos de um indivíduo a quem os arqueólogos chamaram de guardião da tumba. Outros três fardos  posicionados ao pé da parede sul fazem parte desse funeral, e ainda estão sendo analisados, inclusive do ponto de vista forense. Eram indivíduos que foram enterrados com diversos ornamentos pessoais e foram possivelmente soldados da guarda pessoal.

A dama estava com vários vestidos vistosamente estampados e levava o cetro real moche, além de adornos de nariz, anéis, brincos, tiaras e colares. A governanta hoje está no museu de El Brujo, após viajar por Londres, Estados Unidos, Alemanha e Argentina. El Brujo, localizado na região de La Libertad, traz 5000 anos de história em seus cerca de 100 hectares. Ocupada pelos primeiros caçadores e coletores nômades, foi o assentamento de uma cultura tão antiga quanto misterioso. O arqueólogo Régulo Franco Jordán vem dedicando anos de estudo de valor inestimável, em seu trabalho de desvendar a história dessa civilização.

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