“A arte existe para que a verdade não nos destrua.” (Nietzsche)
Já faz algum tempo que a foto abaixo circula pelas redes sociais, gerando justificadas manifestações de repúdio:
Afinal, que ser humano saudável poderia ficar insensível à foto de um menino sendo atacado por uma serpente enorme, e o cinegrafista continuar filmando? E quem fez a foto, então? Só gente muito doente faria isso.
E os comentários indignados seguem no mesmo tom: “Nunca mais vou assistir à NatGeo!”; “Esses repórteres e fotógrafos canalhas fazem tudo pela audiência!”; “A que ponto chegou a humanidade!” Enfim, todo mundo malhando a National Geographic por permitir isso, e também os profissionais que nada fizeram para salvar o menino do ataque. E muitos mais acusando o dedo racista na cena, dizendo que se fosse um menino branco, o fotógrafo e o cinegrafista teriam largado tudo para ajudar…
Ninguém desses que ficaram postando comentários irados se deu ao trabalho de ir checar. Ao contrário, repetindo um fenômeno muito comum na internet, repassaram a foto, gerando mais comentários de indignação.
É assim que se formam as lendas urbanas do século XXI, e que mais tarde se tornam muito difíceis de desmentir. E quem desmente ainda é acusado de vendido ao sistema, e outros epítetos, um estraga-prazer que nos faz deixar de acreditar que humanidade está podre e descendo cada vez mais os degraus fétidos do inferno.
Porque não tem graça mostrar as verdades, é melhor acreditar na mentira, para dar razão aos profetas do apocalipse.
Bem, claro que o ser humano é capaz das maiores barbaridades, não posso negar isso (em Pernambuco, os tubarões estão sendo caçados impiedosamente porque atacam banhistas que entram no mar, apesar de todas as placas espalhadas pela praia para não entrar – esquecendo que os tubarões só estão ali na orla porque o homem está destruindo seu habitat ao reformar um porto nas proximidades… Ou seja, a culpa é do tubarão. É a mesma coisa que banir o chuveiro elétrico porque tem gente que morre eletrocutada).
Maaasss…
Como em quase tudo na vida, há sempre dois lados. E sou da opinião que, antes de sair acusando a tudo e a todos, a gente deve ter alguma base para acusar… Ou não acusar!
(No caso dos tubarões atacando banhistas na praia, temos a imprudência dos turistas, já que a praia possui placas de aviso por todos os lados. Mas… Em vez de sair apontando o dedo para os turistas ou continuar matando os bichos, não seria melhor fechar a praia enquanto se avalia a obra que prejudica o habitat dos tubarões, para tentar minimizar os danos?)
Vamos voltar à foto do início e revelar a verdade sobre ela:
1. Não é um menino, é uma menina.
2. É uma imagem de um documentário da Discovery da série “Nature’s Deadliest” (não sei como foi batizada no Brasil) de 2008. Essa imagem é do episódio 4, chamado “África”.
3. É uma reencenação de um fato real: uma menina foi atacada por uma cobra, um homem conseguiu desenrolar a perna da garota e salvá-la, mas acabou sendo esmagado no lugar da criança.
É apenas uma dramatização, com uma cobra cenográfica, como se vê nas fotos abaixo, que são cenas do programa:
A Discovery ainda avisa, no início da exibição, que era uma dramatização e que “haveria cenas que poderiam se perturbadoras para algumas pessoas”.
Quer dizer, alguém colocou o logotipo da National Geographic – que não tem nada a ver com nada, já que o programa era da Discovery – e espalhou a foto pela internet, gerando então essa massa de comentários na linha “pobres x ricos”, “brancos X negros” e etc.
Finalizando, no documentário que reencena o fato da vida real, quem salvou a menina foi ironicamente um homem branco: desmentindo, portanto, aqueles que fizeram os comentários insinuando que a criança não teria sido salva porque era negra.
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